Sunday, April 17, 2011

41 - Requiescat in pace - O Fim da Terceira República (9)

"Palhaço Triste"
This series of 9 posts was published 5/5/2011 by "Jornal do Fundão" - online edition.

      9. A Terceira República? Requiescat in pace.
Cada país que pede ajuda ao FMI e agora também ao Fundo Europeu (neste caso a Grécia, a Irlanda, Portugal e provavelmente amanhã a Espanha, para não mencionar outros países periclitantes) considera que o seu caso é especial, original, único. No entanto, a única novidade é estes países pertencerem a uma união monetária.
Para quem conheça o trabalho do FMI e de outras caixas mutualistas dos Estados, estas são histórias repetitivas. A culpa nunca é de quem não se soube governar, de partidos que prometem mundos e fundos para ganhar eleições e depois gastam mais do que o país produz. A culpa é sempre de quem empresta e em troca obriga a viver dentro dos seus meios, pagar as dívidas, desenvolver a economia e cumprir as regras de bom comportamento no comércio internacional. 
    Os governantes sem visão e sem autoridade, necessitam do "papão" duma entidade exterior a quem atribuir a culpa das reformas necessárias mas dolorosas. Quase sempre a estratégia funciona, os eleitores são suficientemente infantis para acreditarem nessas tretas, como afinal acreditam em muitas outras.
Mas os factores que entram no sucesso dos programas de ajuda externa, ou no seu falhanço, também são conhecidos. O sucesso vem da honestidade na avaliação, da celeridade do pedido, do acordo das forças políticas, da ordem social e da disciplina na execução dos programas. O falhanço é inevitável quando o desequilíbrio financeiro é excessivo, quando os juros dos empréstimos são demasiado altos e a recessão impede o crescimento da economia, quando o tempo necessário ao reembolso das dívidas não permite que a sociedade aguente os sacrifícios, quando os mercados se conluiam em alcateia com as agências de rating para atacar uma presa em dificuldade e lhe cortam todas as rotas de escape.
    Quando a situação assim o exige, é preciso saber jogar o xadrez multi-dimensional e multi-lateral, jogar primeiro a favor da corrente, esperar o momento e então ter a coragem de dizer basta. Por agora, Portugal está sem dinheiro e precisa imediatamente dum empréstimo. Negocie-se com dignidade e obtenham-se as melhores condições possíveis com a ajuda do FMI, que neste caso é melhor aliado do que os Europeus que também vão emprestar os fundos e querem fazer um exemplo dos três irmãos pródigos, obrigando-os a pagar juros elevados. Mas, quando a corda não estiver na garganta, é preciso reestruturar a dívida.  
Em geral, os países em dificuldade, ou mais especificamente as suas elites dirigentes, entram primeiro em negação, depois propagam esperanças fantasiosas e só tarde demais aceitam a realidade da situação. Durante todo este tempo é a população mais frágil que sofre as consequências do pretendido orgulho nacional, mas do muito real egoísmo das cliques governantes. 
       No caso dos três países do Euro que estão neste momento na berlinda, a situação complica-se com as declarações dos responsáveis da União, que já mencionaram que mais tarde a reestruturação fará parte dos pacotes de ajuda. Quando o génio sai da almotolia, já não volta a entrar. Nem os mercados, nem ninguém de bom senso, acredita que as ajudas presentes não venham a seguir o mesmo caminho.
É nestes momentos que se distinguem os palhaços dos estadistas, nacionais e europeus. Os palhaços desperdiçam o tempo dos espectadores em falsas histórias e falsas querelas, apenas para prolongar o seu próprio tempo na pista. Os estadistas sabem negociar e eventualmente fazer bluff, na defesa dos interesses superiores das nações e da União. Sabem decidir a seu tempo as rupturas necessárias e tomar a responsabilidade de mudar de direcção.
Foi na audácia de rupturas que nasceu Portugal e foi assim que sobreviveu a muitas crises da sua história. Esta é mais uma. Os portugueses precisam de esperança, precisam de estadistas que lhes mostrem uma luz no fim deste túnel em que entraram. A luz duma mudança de regime político, que reforme e actualize a Constituição, as instituições, as estruturas sociais e tudo o resto que daí deriva. 
        Venha a Quarta República o mais cedo possível. Como estamos ancorados na União Europeia e já não existe o perigo de fundamentalismos ideológicos prevalecerem, só poderá ser melhor do que a Terceira.

JSR

11 comments:

  1. Escrevo este comentário movido pelo entusiasmo que senti quando voltei a este "blog" e me senti desactualizadíssimo - aí estavam nove capítulos de um espantoso "O Fim da Terceira República" que sorvi de um trago, nove sinfonias (o número é carismático...) de "requiem" pelo desvario em que viveu a nossa coisa pública nos últimos tempos. Bem haja! Um leitor atento - jno

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  2. Obrigado pelo comentário, é encorajador saber que outros partilham as mesmas preocupações com a situação e fazem uma análise semelhante das suas causas. Assim se possam encontrar soluções.
    Volte sempre, com as suas reflexões, ideias e sugestões.

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  3. Caro cagedalbatross, com a sua autorização vou fazer o link destas "crónicas" no Quarta República, acho que é muito adequado!

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  4. Brilhante Caged :))
    Muitos parabéns.
    Como dá para notar, tenho que seguir o seu blogue, não só por ser inspirador mas também pelo meu "fanatismo" por mitologia grega.
    Bem haja :)

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  5. Realmente, nada de mais natural do que fazer o link das crónicas sobre o fim da Terceira República para o blog da Quarta... Para mais, em boa companhia. Encontramo-nos todos nas preocupações actuais e nas esperanças para um futuro melhor. Much obliged.

    Compliments will get you anywhere, Anthrax… and, indeed, I’m flattered to have you as a follower, a demanding critic and fellow classic Greek fan…

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  6. Querido Caged Albatross, estes textos, sobre o Fim da Terceira República, são uma análise rigorosa dos caminhos que nos trouxeram até aqui e merecem ser o exemplo de uma verdadeira pedagogia informativa, a difundir largamente.
    Pela minha parte, lançarei um pequeno grão...
    Maria Eduarda Boal

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  7. Querida Eduarda, muito bem vinda a este espaço, desejo que muitos outros comentários e críticas se sigam. Fico contente se os textos tiverem alguma dimensão pedagógica, sobretudo quando a avaliação vem duma grande especialista na matéria...
    Tentarei continuar a manter a qualidade do blog à altura da qualidade dos leitores.

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  8. Irás ao Paço. Irás pedir que a tença
    Seja paga na data combinada
    Este país te mata lentamente
    País que tu chamaste e não responde
    País que tu nomeias e não nasce

    Em tua perdição se conjuraram
    Calúnias desamor inveja ardente
    E sempre os inimigos sobejaram
    A quem ousou ser inteiramente

    E aqueles que invocaste não te viram
    Porque estavam curvados e dobrados
    Pela paciência cuja mâo de cinza
    Tinha apagado os olhos no seu rosto

    Irás ao Paço irás pacientemente
    Pois não te pedem canto mas paciência

    Este país te mata lentamnente
    (lc)

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  9. Por engano, citei como autor o Luis de Camões, quando na realidade o poema não é dele mas sim da Sofia M B Andersen, que o dedicou a Camões

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  10. Cecília, citar um poema dedicado ao grande Camões a propósito do meu pequeno "manifesto" é duma bondade sem medida. Já a constatação de que "este país (te) mata lentamente", quem usa o pseudónimo "Caged Albatross" tem que apreciar a comparação e a ironia...

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