Thursday, May 10, 2012

103 - A Destruição das Catedrais

Ruinas de S. Paulo - Macau
Published 17/05/2012 by "Jornal do Fundão".

   As “Catedrais” onde ainda se guardam a identidade, os conhecimentos, as certezas e os tesouros de cada nação, estão a ser irremediavelmente abertas e por vezes destruídas pelo avanço das marés da globalização. As mudanças trazidas em progressão geométrica pela evolução da ciência, da tecnologia, da integração  económica e das vagas de transformação industrial, acontecem depressa demais para a capacidade de adaptação política dos povos e das suas estruturas sociais.
Os governos dos países mais desenvolvidos, em vez de responderem às causas do declínio com as reformas estruturais adequadas para conseguir manter o patamar de abundância atingido pelas suas populações, são reféns das promessas imediatistas que os elegem e complacentes com a manutenção dos interesses instalados. Os povos tem a memória curta, o que os leva a votar uma vez e outra em quem mais promete e não no melhor projecto político. Normalmente quem mais promete são os mais medíocres, que se deixam arrastar em vez de dirigir.
O resultado das eleições na França e na Grécia não foi surpresa nenhuma. Desde que começou a crise, em todos os países europeus os partidos no governo perdem as eleições. Para definir estas situações bastam um par de parágrafos, porque as análises detalhadas só interessam a quem tem que viver na espuma dos dias.
A França faz a ponte entre a Europa germânica do Norte e a românica do Sul, por isso muita gente se interroga sobre o que vai fazer Hollande e as consequências para outros países. Com a volta dos socialistas ao poder, vamos assistir a uma repetição dos mesmos erros que cometeu Mitterrand no seu tempo e que o levaram a meter rapidamente o seu programa eleitoral na gaveta. Desta vez pode ser mais penoso devido ao momento em que Hollande fez as suas promessas absurdas, esquecendo as fragilidades crescentes do seu país. Quanto a influenciar outros governos europeus, continuará decerto Monti a ser mais credível, com a sua combinação de necessidade das reformas estruturais, cautela na escolha das medidas de crescimento económico e um maior papel para a Comissão.
A Grécia tem o destino traçado desde que a maioria do capital móvel (dos investidores, das empresas que ainda pagavam impostos e até muitas das economias da classe média) fugiram do país. Um pais dividido e ingovernável, que ainda não expurgou os seus demónios da longa ocupação otomana (a divisão em clans e a resistência à autoridade central) e que ainda não adquiriu capacidades de deixar funcionar sequer o simulacro de democracia que existiu desde o fim do regime dos coronéis. Mesmo isso só foi possível pelos estratagemas usados para obter o máximo possível de fundos de coesão e pela corrupção generalizada durante a distribuição dos dinheiros europeus a todos os grupos de interesses. Como a maioria dos votantes está contra as medidas de saneamento económico, deixa de ser possível maquilhar a realidade da bancarrota, o que significa a saída do Euro e por consequência a desordem. A necessidade de por ordem na sociedade passa por uma solução autoritária, o regresso ao passado. A derrocada grega trás, essa sim, contágios perigosos. Mas com todo este tempo para se preparar para a situação, se a Zona Euro não tem já prontas as medidas políticas e fiscais necessárias, é porque não merece existir.
A evolução da crise e dos problemas europeus só pode passar pela compreensão das mudanças da ordem económica mundial e pelas medidas necessárias para a expansão das industrias do conhecimento e todas as outras áreas em que os países desenvolvidos ainda têm vantagens competitivas. Mas mesmo esta nova revolução industrial em marcha, que vai trazer de volta muitas industrias manufactureiras, só vai resolver o problema do desemprego nas áreas mais especializadas que necessitam de cada vez mais conhecimentos e menos pessoal. Fora das altas especializações e dos serviços de qualidade há cada vez menos portas de salvação nas “Catedrais” da Europa.
JSR

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