Friday, December 7, 2012

136 - As Metamorfoses de Judite (Conversas Surrealistas)


Na televisão, não se pode fazer zapping à hora dos noticiários sem cair sobre a Judite. Na TVI, um campo de refugiados na guerra civil da televisão pública.
Assim que aparecem os anúncios, muda-se de canal. Foge-se da Popota, dos Fedorentos, do António Sala e dos outros vendedores de banha da cobra - e tropeça-se na Judite que apresenta as notícias.
Enjoa-se das cabeças falantes da RTP, formatadas num universo de notícias sem esperança desde que foram confrontadas com o futuro negro da privatização - e aterramos no nariz da Judite que entrevista um recalcitrante.
Tomamos uma água gasosa, para ajudar a digerir os insuportáveis papagaios sentenciosos a quem a SIC encomendou a queda do governo, antes que a privatização da RTP lhe estrague o negócio - e a máquina do tempo transporta-nos para debaixo da mesa onde a Judite lê as deixas a um oráculo.
Mas atenção, nunca é a mesma Judite.
Há a Judite das notícias, modelo das modistas, das cabeleireiras, das... (como se chamam as criaturas que “produzem” as caras das senhoras?). Judite, the fashion show mature model...
Há a Judite com o penteado de serpentes duma das Fúrias da mitologia greco-romana, que entrevista o primeiro ministro. Agressiva em vez de inquisitiva, a interromper com novas perguntas sem esperar pelas respostas, com um olhar de lado, desconfiado, duvidoso. Judite the bitch...
Há a Judite secretária assistente  de Marcelo, encarregada da agenda e das “dicas”, atenta, respeitosa e agradecida. Judite the groupie...
Há a Judite com ar de colegial oferecida e ambiciosa com Medina Carreira, dando fielmente à manivela da grafonola para ouvir mais uma vez o mesmo fado corrido, na esperança de obter uma boa nota. Judite the post grad...
Há a Judite fugidia, surpreendida e consciente de não ter feito o trabalho de casa, no programa com António Câmara sobre Economia do Conhecimento. Judite the fudge...
A mulher não só tem só o dom da ubiquidade, também é feita de plasticina.
Não sei se estes profissionais da TV frequentaram escolas de jornalismo, comunicação ou qualquer coisa desse tipo. Porque há bons profissionais da comunicação em Portugal, uma mão cheia. Mas também há os chatos, as mosquinhas mortas, as wannabe pop stars, os bandoleiros, os verbos de encher. Basta ver o trabalho dos bons entrevistadores como Barbara Walters, Larry King, Anne Sinclair, Richard Quest e alguns da BBC, para se apreciar as diferenças. A primeira das quais é que a “estrela” deve ser sempre o entrevistado e nunca o entrevistador. 
        Na realidade, tudo isto tem cada vez menos importância. Ver televisão é já uma actividade que denota uma certa idade. As novas gerações mais tecnologicamente avançadas nem sequer têm um aparelho de televisão. Informam-se e divertem-se na internet, onde os mais interessados podem ver as edições on-line dos jornais, mas ignoram soberbamente a programação televisiva e nem conhecem os nomes de quem serve de âncora às audiências em extinção.
JSR

4 comments:

  1. Excelente visão sobre esta jornalista.
    E quando me lembro do video que mostrava os momentos delico-doces de uma sua entrevista a José Sócrates, ainda acrescenta mais uma dimensão a esta senhora...

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  2. Obrigado pelo comentário. Fico com curiosidade acerca dessa entrevista a Sócrates, que não me lembro de ter visto e que vou tentar encontrar.

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  3. O vídeo é uma paródia, como é evidente, mas a pergunta que ela fez foi real... e inacreditável, acrescentaria eu ainda! Fica aqui o link: http://www.youtube.com/watch?v=8mKFilQDs4c

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  4. Está muito bem feito, não só a ideia é hilariante como a montagem realça o ridículo da pergunta. Uma metamorfose que eu não conhecia e teria merecido referência no post. Sarcástica...

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